Refit: Delphine – A lenda ainda vive

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Perto de completar um século de navegações, o fabuloso Delphine, este gigante de 258 pés, nascido na prancheta do mitológico fundador da marca de carros Dodge, tem uma história como poucos: já pegou fogo, naufragou e até foi à guerra, mas está longe de dar sinais de que esteja à espera de museu.

 

Apaixonado pelo mar e tudo o que envolvia grandes navegações, o americano Horace Elgin Dodge, o mais novo dos três irmãos da família Dodge, fundadores de uma das maiores empresas automobilísticas do mundo, sempre desenvolveu seus próprios carros, da carroceria ao motor, mas nunca escondeu de ninguém o desejo de construir barcos – não simples cascos, mas grandes navios. Em 1904, Horace começou a tornar o sonho realidade: desenhou e encomendou o primeiro barco com a “marca” Dodge: um 40 pés de madeira. Seis anos depois, Horace já era dono de dois outros barcos. Nascia ali a Dodge Marine Division, um braço náutico do negócio automobilístico da família.

 

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Até a época em que os aviões começaram a tomar o lugar dos navios nas grandes viagens, os grandes navios eram mais do que simples meios de transporte. Eram oportunidades para os passageiros das classes superiores demonstrarem opulência e saborearem o glamour que os navios proporcionavam. Esse era o desejo de Horace. Mas os barcos da família Dodge tinham um “problema”: pouco espaço para acomodações. A solução? Construir barcos cada vez maiores.

 

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O primeiro grande casco de Horace foi um 180 pés, batizado de Nokomis I. Quatro anos depois, ele desenhou outro, ainda maior: de 243 pés. Mas ainda não estava plenamente satisfeito. Em 1920, em homenagem ao nascimento de sua primeira filha, Horace investiu em mais um navio: encomendou o Delphine, de 258 pés, com o qual pretendia realizar longas viagens em família, primeiro pelos lagos americanos e, depois, cruzeiros mais ousados.

 

Mal sabia, porém, que uma tragédia, naquele mesmo ano, colocaria fim aos seus sonhos. Após a morte do irmão, decorrente de uma misteriosa gripe, Horace também contraiu a doença e não resistiu. Com a fatalidade, ele não testemunhou o lançamento de um dos maiores legados atuais dos mares. Com um misto de alegria e tristeza, o Delphine foi, enfim, colocado nas águas do Rio Rouge, em Michigan, nos Estados Unidos. Na época, não havia barco maior no país. As instalações eram, de fato, surreais.

 

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Além do enorme camarote do proprietário, os hóspedes tinham à disposição outros nove camarotes. Ao todo, cerca de 50 pessoas faziam parte da tripulação, devidamente acomodada em uma área no deck inferior, perto da proa, para não ter contato com os ambientes frequentados pela família. Horace projetou o Delphine para atingir 15 nós – o que era um marco para a época. Até os motores a vapor (os mesmos usados até hoje!) saíram de suas pranchetas.

 

O majestoso Delphine tinha tudo para singrar as águas do mundo e fazer história. Mas seu suntuoso casco tomou outro rumo: nas mãos do jovem Horace Junior Dodge, o elegante salão tornou-se palco de refinadas festas e coquetéis, muitos deles para acompanhar as corridas de speedboats, a grande paixão do herdeiro de Horace.

 

Parecia que esse seria o derradeiro fim do Delphine, um grande salão de festas. Mas, em 1926, depois de mais uma maratona de agitadas comemorações, regadas a muita bebida e bailes dançantes, ao som de vitrolas, uma tragédia: misteriosamente iniciou-se um incêndio na casa de máquinas, que se alastrou por todo o barco. Ninguém se feriu, apenas o Delphine, que não suportou os estragos no casco e afundou ali mesmo, em Nova Iorque.

 

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Mais um baque para a família Dodge. Mas Anna Dodge, viúva de Horace, não queria que esse fosse o fim decadente do maior sonho do seu marido. Anna o resgatou, restaurou e o usou quase como uma casa de veraneio durante longos 16 anos, quando, mais tarde, foi à guerra, requisitado pela Guarda Costeira dos Estados Unidos para missões de patrulhamento. Além da nova missão, ganhou um novo nome: USS Dauntless (PG-61). A bordo do “Delphine”, líderes mundiais, como o próprio presidente americano Franklin Roosevelt, tomaram decisões importantes.

 

Com o fim da guerra, Anna adorou a notícia de que poderia comprar de volta o iate da família. E assim o fez. Depois de orgulhosamente servir aos interesses da pátria americana, o “velho” Delphine voltava ao lar dos Dodge, ficando ancorado em um píer privativo até 1967, quando, após a morte de Anna, fora doado à The People-to-People Health Foundation. A partir daí, ele renasceu como um “navio escola” de Lundeberg Maryland, servindo por quase duas décadas para treinar novos marinheiros mercantes.

 

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Após isso, o Delphine teve uma vida turbulenta, passando de mão em mão. Nos anos 90, foi vendido para a Sea Sun Cruises, uma empresa francesa sediada em Singapura. Com eles, o navio fez sua primeira (e única, até hoje) travessia do Atlântico. Ao chegar a Malta, no Mediterrâneo, a empresa desistiu da ideia de reformá-lo. Contudo, outro empresário, viu essa preciosidade ancorada em Marselha, na França, e decidiu comprá-lo e restaurá-lo por inteiro na Bélgica. Depois de pronto, há 9 anos, o Delphine ficou do jeito que está nestas fotos: estilo clássico e conforto contemporâneo. Após um longo período de charter, o navio aportou em sua nova casa, Mônaco, onde foi recebido pela princesa Stéphanie.

 

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Atualmente, o Delphine está nas águas da Tunísia e à espera de um novo dono. Sim, ele está à venda: 38 milhões de euros. Mas nenhum broker tem autorização para intermediar a negociação, apenas o atual proprietário, que faz questão de analisar pessoalmente os possíveis futuros donos. Tudo para que o Delphine não seja tratado apenas como um barco qualquer – o mesmo esmero que Horace Dodge teria pelo navio que tanto sonhou ver navegando.

 

Delphine

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