Adaptadores de tomada de cais: o especialista responde

Quantos adaptadores para a tomada de cais você leva a bordo? Mesmo assim, quantas vezes você chega numa marina e nenhum deles serve? Esta questão aflige nove entre dez donos de bacos. É só atracar que começa o sufoco. É preciso deixar o gerador ligado, desandar a procurar algum eletricista que saiba como ligar o barco ao cais e, não raramente, acaba-se comprando um novo adaptador.

Há situações ainda piores, nas quais, por alguma razão que ninguém consegue explicar, a marina adota uma só tensão e um padrão único, onde poucos conseguem se conectar e muitos acabam tendo que comprar transformadores ou reformar toda a instalação elétrica para se adequar. Qual o motivo de tamanho desencontro?

A resposta é que falta uma convenção entre as marinas para que seja adotado um ou dois padrões que poderiam atender mais de 90% das embarcações fabricadas no Brasil e até mesmo as importadas. Outro motivo é o desconhecimento, pois já existem normas brasileiras e internacionais, a NBR 7845, a IEC 60309-1 e a IEC 60309-2, que regem a fabricação dos conectores plásticos industriais que são usados em 100% das tomadas para cais de marinas e nas embarcações produzidas atualmente no Brasil.

Não é difícil arrumar esta bagunça. Basta adotar as normas já existentes e nada melhor que sugerir esta solução na nossa Boat Shopping.

Antes de mais nada, deixamos claro que, por uma questão de segurança, as marinas devem, obrigatoriamente, disponibilizar um ponto de “terra” na tomada de cais. O “terra”, ao contrário do “neutro”, não deve ser usado de forma alguma para conduzir energia. “Terra” é “terra” e “neutro” é “neutro”. São coisas diferentes, facilmente confundidas até mesmo por alguns eletricistas que perambulam pelas marinas. “Terra” é um condutor que está conectado a uma barra de cobre, ou conjunto de barras de cobre, enterrada no solo da marina e o “neutro” vem do transformador de entrada de energia da marina.

A função do “terra” é deixar o casco e seus metais submersos no mesmo potencial que o solo da marina. O “terra” está ali para salvar sua vida e somente conduz energia elétrica se algo estiver muito errado.

Sabe-se que toda e qualquer corrente elétrica caminha no sentido do menor potencial, o solo do planeta Terra. Por exemplo: se um cabo com corrente elétrica encostar na carcaça de sua geladeira e você estiver molhado, ou descalço, e encostar nela, você vai ser o caminho perfeito para que as correntes cheguem à Terra. Como você não é um cabo de cobre, a corrente que passa por seu corpo é pequena demais para o disjuntor ou fusível daquele circuito vir a desarmar, mas é suficientemente alta para te matar.

Lembramos que 30mA são suficientes para matar uma pessoa. Se a carcaça de sua geladeira estiver ligada ao aterramento da embarcação e este ao solo da marina, qualquer cabo vivo que encoste na carcaça se transforma num curto-circuito fase-terra e a corrente será alta suficiente para desarmar o disjuntor daquele circuito quase instantaneamente.

É certo que esta conexão do seu barco ao Terra da marina deve ser feita cercada de vários cuidados para não trazer problemas de corrosão ou eletrólise, o que foge ao objetivo deste artigo, mas todos precisamos ter em mente que aterrar a embarcação ao cais pode salvar vidas.

Quanto às conexões de cais, como já mencionamos aqui, bastaria seguir o que já está normatizado no Brasil e no exterior. Assim, além de evitar dores de cabeça e contratempos para os proprietários das embarcações e funcionários das marinas, estaríamos praticando ações seguras.

Veja um resumo do que estas normas dizem:

Sempre que uma embarcação necessitar ser conectada a uma fonte de energia em terra, deverá ser usada uma tomada de energia apropriada e um cabo flexível conforme especificado abaixo:

  1. Um plugue macho e uma tomada fêmea em terra de forma a dificultar o contato acidental com partes energizadas.
  2. Um plugue fêmea e uma tomada macho na embarcação de forma a dificultar o contato acidental com partes energizadas.
  3. O casco ou o aterramento da embarcação e o cais deverão, obrigatoriamente, estar no mesmo potencial. Para tanto, o “terra” da tomada deve estar conectado ao casco ou ao aterramento da embarcação.
  4. As tomadas e plugues deverão estar de acordo com as normas NBR 7845 IEC 60309-1, IEC 60309-2. Estes conectores devem ser de tal forma que um plugue só poderá entrar numa tomada exatamente do mesmo tipo. Capacidades de corrente diferentes (16 A, 32 A, 63 A e 125 A) deverão possuir conectores de diâmetros diferentes. Tomadas são padronizadas em cores, de acordo com a tensão nominal máxima presente na mesma. Veja a Tabela 1 abaixo. Para cada configuração dos seus pinos, fases, neutro e terra, as tomadas têm uma posição diferente do pino terra em relação a uma lingueta de encaixe.

 

Tabela 1:

Cor do conector em função da tensão máxima de utilização em 60 Hz.

Tensão Máxima  Cor do conector
130 Volts Amarelo
250 Volts Azul
480 Volts Vermelho

 

O pino terra deverá ser sempre o mais grosso. Apenas a conexão correta plugue-tomada poderá ser feita.

Assim como o relógio, o pino ligado a terra poderá estar em 12 posições separadas por 30 graus ao redor da circunferência, considerando a lingueta de encaixe sempre olhando para baixo. Para efeito de padronização da posição dos pinos e da lingueta de encaixe, considerar sempre o lado fêmea do conector (seja ele plugue ou tomada) visto de frente, pelo lado aberto.

Sempre que houver neutro, este pino deverá ser o mais próximo do pino terra, no sentido anti-horário, olhando o lado fêmea do conector (seja ele plugue ou tomada) visto de frente, pelo lado aberto. Veja Tabela 2.

 

Tabela 2:

Padronização das conexões de terra para embarcações de até 24 m, com tensão máxima de 300 V, sempre vistas pelo lado aberto:

 

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Há, ainda, casos nos quais a tensão disponível na marina simplesmente não casa com a do seu barco. O caso mais comum são embarcações com sistemas elétricos em 110 V ou 120 V (embarcações conforme padrão americano), que necessitam ser conectadas a marinas onde há 220 V ou, mais raramente, vice-versa. Neste caso, a marina poderá seguir o padrão correto, conforme tabela acima, mas isso não resolve o problema de incompatibilidade de tensão. Em casos como este, a única solução é utilizar um transformador intermediário que compatibilize esta ligação.

Transformadores são normalmente pesados, grandes e difíceis de carregar e, além disso, deve-se ter toda a atenção para que a carcaça deste esteja aterrada e para que, mesmo com o uso de transformador, ainda seja feita a ligação do “terra” da embarcação ao “terra” da marina.

A melhor solução seria a marina disponibilizar um transformador portátil com rodinhas à prova de tempo, que seria usado apenas em barcos nos quais a tensão de entrada fosse incompatível com a da marina. Isso evitaria a necessidade de ter a bordo uma caixa grande e pesada que seria apenas usada algumas poucas vezes, quando o barco estivesse naquela marina.

Há, entretanto, algumas soluções no mercado nacional como os autotransformadores automáticos fabricados pela empresa Terramar, em São Paulo, que acondicionam de forma fixa a tensão de entrada do cais à tensão de trabalho da embarcação. Autotransformadores são menores e mais leves que os transformadores, porém, ao contrário destes últimos, não isolam a entrada da saída. Em embarcações de fibra ou madeira, se respeitadas as regras de aterramento aqui descritas, isto não representa problema algum.

Para aqueles que têm embarcações importadas cujo sistema é 50 Hz, existem conversores de frequência que, além de adaptar a frequência do cais (no caso, 60 Hz), também acondicionam a tensão de entrada para que seja compatível com a da embarcação. Antes exclusivo para embarcações grandes, hoje já existem módulos menores da Atlas Marine Systems (representada no Brasil pela Electra Service) de 3,5 KVA que podem ser expandidos até 17,5 KVA. Mais sofisticados que os autotransformadores automáticos, estes isolam completamente a entrada da saída e podem ser usados em qualquer tipo de embarcação.

Não está tão difícil você ficar ligado, basta que todos sigam aquilo que hoje já é uma convenção e prezem pela segurança. A tecnologia também ajuda aqueles que ainda necessitam um empurrãozinho a mais.

 

Por: Roberto Brener

Tomada de cais

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