Por Marco Antonio Ferrari Carneiro para Boat Shopping

Saudações, navegantes!

Primeiramente, chamaremos o conhecido lixo de resíduos sólidos, pois lixo é tudo aquilo que sobra da atividade humana. Mas os resíduos são materiais sólidos que podem ter diversas utilidades. Talvez a maioria não saiba, além de skipper e instrutor de segurança marítima, sou médico veterinário com especialização em administração e educação ambiental, o que me leva a abordar um pouco deste tema, afinal estar no mar é cuidar da segurança dos navegadores, banhistas e meio ambiente.

Como podemos evitar a presença de resíduos sólidos no mar e o que fazer com o que temos a bordo? Quais as consequências caso a legislação vigente não seja cumprida? Vamos responder estas questões, antes, porém, vou contar alguns casos que presenciei pelo mar.

Uma noite ancorada na Ilha Grande, no Rio de Janeiro, ouvi um motor de popa e logo localizei o bote. Era um marinheiro saindo de com uma bela lancha na madrugada para desembarcar o lixo no meio do mato. Ele subiu pelas pedras, entrou no mato e escondeu os resíduos. Imediatamente, peguei o lixo e o devolvi na bandeja da lancha. Bela surpresa para este marinheiro logo pela manhã, não?

Em outra navegada em um veleiro, nos anos 1980, as famosas latinhas de refrigerante e cerveja chegaram para o facilitar nossas vidas e, também, para sujar o mar. Cada vez que uma latinha acabava, ela terminava na água. Perguntava ao comandante se estava certo. Ele respondia que o material iria de decompor logo ou viraria casa de animais no fundo do mar. Pensei que era o primeiro programa de casas populares para animais marinhos.

Com essas pequenas experiências, além de atravessar o Atlântico e ver lixo de todo tipo pelo mar, fez com que eu me aprofundasse neste tema. Logo encontrei a legislação da Organização Internacional Marítima (IMO), órgão da ONU, que o Brasil participa e segue suas orientações internacionais, entre elas a Convenção Internacional para Evitar a Poluição no Mar (MARPOL).

De acordo com a IMO-MARPOL, é permitido ou não jogar resíduos no mar? Sim, mas dentro de algumas normas. Confira :

Regulamentação da Disposição da IMO MARPOL 73/78

• Alimentos, papel, trapos, vidros etc (pulverizados ou triturados) > Mais de 3 milhas da costa
• Alimentos não pulverizados ou triturados. Papel, trapos, vidros, metais, garrafas, louças e similares. > Mais de 12 milhas da costa
• Elementos que flutuem , panos e produtos de papel > Mais de 25 milhas da costa
• Plásticos, cabos sintéticos, redes de pesca, bolsas plásticas ou similares > Eliminação proibida
• Misturas desconhecidas com substâncias prejudiciais ao meio ambiente e ao homem > O descarte seguirá normas rígidas

Permitido é, mas na medida do possível não devemos. Segundo as normas internacionais, não pode lançar resíduos em baías, enseadas, ilhas e praias. Suponhamos: 20 barcos ancorados em uma noite, cada barco com 4 pessoas a bordo, sabe quanto lixo será produzido em média? Um quilo por pessoa, isto é quatro quilos de lixo por embarcação. Imagine todos lançando lixo ao mar: serão 80 quilos na maravilhosa enseada.

E as consequências? Além de multas por crime ambiental, pode ocasionar na morte de algum animal, problemas estéticos com lixo boiando, doenças (alguém a bordo poder portar alguma doença infecciosa e jogar seu material de higiene no ambiente).

Os animais marinhos sofrem com os resíduos, podendo causar morte por asfixia pelo plástico. Nos golfinhos, por obstrução do orifício respiratório. Nas tartarugas, comer por acharem que é uma alga, o que obstrui o intestino. Peixes podem comer pão com fermento e produzir gases em seu intestino dificultando a natação. As aves, especialmente, capturam alimentos que flutuam e não diferenciam que uma tampa de refrigerantes seja plástico ou que uma bituca de cigarro não é um filhote de peixe.

O que fazer com resíduos a bordo?

• Separe o resíduo do barco em seco (material não contaminado) ou úmido (lixos de banheiros, filtros de cigarros, etc); orgânico (alimentos) ou inorgânico (plásticos, metais e embalagens) recicláveis ou não recicláveis, acredito que esta seja mais simples.
• Evite levar caixas de papelão com alimentos para o barco. Além de poder transportar baratas ou outros insetos, não terá como se desfazer delas no mar, são de volumes grandes.
• Compre caixas de plásticos dobráveis, que é fácil de transportar, guardar e é reutilizável.
• Se levar bebidas que possam tomar coletivamente, prefira garrafas de vidros. Além de barato, é retornável.
• Caso tenha que utilizar bebidas individuais, se for plástico ou latinhas de alumínio, lave com água do mar, amasse, deixe secar antes de colocar no saco de lixo. As garrafas pets dão excelentes depostos de arroz, café, açúcar e leite.
• Procure levar alimentos naturais, como frutas. Caso leve enlatados, lave e seque para descarte nos lixos recicláveis (embalagens vazias).
• Embalagens de salgadinhos e doces, lavar com água do mar, secar e guardar.
• Procure ter caixas plásticas para guardar sobras de alimentos; darão ótimas sopas a noite.
• Use as famosas sacolinhas plásticas de supermercado como depósito de descarte. Procure ter sacos de no mínimo 60 litros para fazer armazenamento coletivo, e não acumular sacolas no porão do barco ( que soltam o “caldo do lixo”, o chorume).
• Deposite estes sacos longe dos cabos e de calor. Procure deixar no inflável ou em porões de manutenção. Eles poderão ser armazenados até 48 horas, em média. Acredito com este tempo a maioria dos barcos já aportaram em algum lugar para o descarte autorizado.
• O material orgânico: devemos picar com faca e, durante a travessia, jogar ao mar preferencialmente ao pôr do sol na esteira do barco, assim as aves não tentarão se alimentar.

Em média, teremos a bordo 50% de orgânico, 40% reciclável e somente 10% para descarte em aterro.

Bem, deu para ter uma pequena idéia deste tema tão importante, certo?. Vamos cuidar dos nosso rios, represas, lagos e mares, afinal, estamos aqui de passagem e as novas gerações devem encontrar, se não melhor, ao menos como nós encontramos. Boas navegadas!

Lixo

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